Bruno caminhava por sua casa sem saber o que estava
acontecendo. Havia acordado há apenas alguns minutos com dores de cabeça, culpa
da ressaca da noite anterior.
Procurou na escrivaninha e na terceira gaveta encontrou um
analgésico e tomou. Olhou para o longo espelho que estava encostado na parede a
sua esquerda, refletiu, tentou lembrar o que havia acontecido na noite
anterior...
Mais dores.
Resolveu então tomar banho pra ver se aquilo passava de uma
vez por todas. Ligou o chuveiro e começou seu demorado banho quente enquanto
pensava em quão silenciosa poderia ser uma mansão antiga, nas suas idas e
vindas das delegacias de São Paulo e em como sua vida tinha mudado tanto nos
últimos dias. Bruno estava de férias nos Estados Unidos, havia chegado há cerca
de uma semana, depois de longa espera na liberação do seu visto pelo consulado
americano.
Bruno Martins tem vinte e dois anos e é um bon vivant. Nunca
trabalhou ou sequer quis saber disso. Não pretendia fazer nada além de passar
todas as noites percorrendo as baladas e bares de São Paulo atrás de rapazes
para preencher sua cama. Sua rotina baseava em chatear os pais, que bancavam
todas as suas noitadas, cocaína e anabolizantes e sustentavam o seu apartamento
nos Jardins, suas viagens e toda a confusão causada pelo filho problemático.
Foi então que a família recebeu a informação que o irmão de seu pai havia
falecido e deixado pra trás o império da maior empresa de trens do estado de
Ohio, nos EUA.
Bruno agora é o único herdeiro da fortuna deixada por seu
tio, Francisco Martins, um famoso empreendedor brasileiro que se mudou cedo
para os Estados Unidos para tentar “se dar bem” na vida. Além da fortuna, seu
tio deixou pra ele uma mansão localizada próxima a um grande lago chamado Erie
e sua empresa. Com sorte, Francisco conheceu as pessoas certas, no lugar e na
hora certa. Por anos, trabalhou em uma petrolífera no estado da Pensilvânia,
onde vivia, mas se destacou mesmo com investimentos na indústria ferroviária,
principalmente na cidade de Cleveland, onde está localizada a sede da sua
empresa.
Foi então que os pais de Bruno decidiram que o melhor para
ele, seria se mudar para os Estados Unidos e assumir a empresa do tio, para
obter alguma responsabilidade. Bruno sequer discutiu, estava demasiado
“chapado” de maconha no momento da conversa e só concordou. Para ele, seria
apenas mais alguns dias de diversão, porém em solo americano recheado de
gringos solteiros a espera de alguém que pudesse bancar.
Nesse ponto, Bruno sentiu náuseas e vomitou ali mesmo, no
banheiro. Mal havia saído do banho, ainda nu, olhava para o espelho e só via um
reflexo de um rapaz doente.
Se recuperou, tentou não pensar tanto na noite anterior. Foi
então que voltou pro quarto e vestiu sua cueca, uma jeans velha e uma camiseta Calvin
Klein. Espiou pela janela, já estava escuro e provavelmente já passava das 9h
da noite. Lá de cima via-se apenas o carro de seu tio, sem o motorista, as
mansões vizinhas há alguns quilômetros e as luzes de Raccoon City, mais
distante.
Olhou para o quarto a procura de suas botas, mas a visão de
uma bandeija de comida interrompeu sua procura e logo começou a degusta-la. Sua
lasanha já estava fria, deveria ter sido deixada ali há algumas horas. Então Bruno
deixou-a de lado e caminhou até a porta para chamar Mary, a sua empregada.
Ninguém respondeu.
Lembrou-se que nos fins de semana, ela era a única
responsável pela casa. Seu pensamento hedonista lhe fez imaginar que talvez
Mary deveria estar com o George, o motorista, fazendo alguma coisa “errada”, já
que estavam sozinhos na casa com o rapaz.
Caminhou até a beira da escada, sua barriga roncava. Chamou
Mary novamente, sem sucesso.
Então, sem hesitar, gritou. Nada.
Decidiu voltar para o quarto quando ouviu passos. Ao pé da
escada estava Mary, porém diferente. Seus trajes estavam rasgados e sujos.
Bruno se assustou quando Mary começou a subir as escadas
aparentando embriaguez. Cambaleava fazendo ruídos apenas, com os braços
esticados pra frente e os olhos sem vida. Se aproximava cada vez mais de Bruno,
que assustado, recuou até a porta do quarto.
Mary aproximava cada vez mais gritando e Bruno a alertou
para não avançar. Então a empregada avançou sobre o rapaz, derrubando-o no
chão.
Bruno empurrava Mary, mas a mesma o arranhava muito e
parecia tentar morde-lo de qualquer forma. Bruno então se soltou de Mary e
tentou caminhar até as escadas pra pedir socorro. Mary surgiu atrás dele o
empurrando e sem pensar, ele reagiu a empurrando escada abaixo.
Depois do estrondo da queda, Bruno se sentindo culpado
caminhou até a empregada. O corpo imóvel de Mary jazia no chão, sem vida. Então,
verificou que corpo não havia mais pulso ou sinal de respiração. Correu então
até a sala, mas não encontrava o telefone. Abaixou-se, procurou nas gavetas e
nada. Voltou para a porta da sala, e ao chegar ao átrio principal, viu Mary
rastejando em sua direção. Novamente fazia muito barulho, e parecia um animal
atrás de comida. Bruno então subiu as escadas correndo, pois a empregada não
conseguiria subir as escadas nessa situação.
Ao chegar ao topo da escada, se deparou com o motorista. Ele
correu para Bruno do mesmo jeito que Mary havia feito, então Bruno encostou no balaústre
e no exato momento em que o motorista avançou sobre ele, Bruno empurrou o
motorista para o centro do átrio, que o puxou junto. Com a queda, um grande
estrondo.
George, o motorista, estava com o pescoço quebrado e com uma
fratura exposta. Já Bruno, ainda tentava assimilar o que tinha acontecido.
Tentou levantar, mas não conseguia movimentar suas pernas.
Foi então que percebeu que Mary rastejava em sua direção.
Bruno tentou com todas as forças se movimentar, mas tudo era
em vão.
Foi então que...